Os ventos uivavam naquela noite de primavera mais fria do que qualquer outra noite do último inverno. Apesar disso, não havia nuvens; o céu era um fundo negro pontilhado de estrelas cintilantes. Ravenna se resguardava na escuridão, enquanto os soldados se reuniam do lado de fora da aldeia – mais de 300 soldados Zíngaros e Gunderlandeses, trajados a aço e couro, com suas expressões carrancudas delineadas pela luz avermelhada das fogueiras nos acampamentos mercenários. Todos os olhares convergiam para os vales a leste, que terminavam em pequenas florestas de pinheiros aos pés das montanhas de Hispan, abrigando as trilhas que levavam ao Condado de Attasia. Baal assumia a linha de frente; o nobre mutilado estava imóvel como uma estátua, com seu elmo em mãos e a capa esvoaçante. Apenas o crepitar das fogueiras que oscilavam entre as fortes ventanias era ouvido. O vale estava silencioso e escuro, como a morte.
-Empalarei o maldito que deixar qualquer um deles entrar em Ravenna. Ninguém passará vivo por nós! Entenderam, cães? Ninguém! _A voz de Baal ressoava como um trovão. O único nobre do norte Zíngaro que conquistara pela força as terras que possuía, ostentava as marcas de ferozes batalhas em seu corpo; de cicatrizes e dedos mutilados ao buraco grotesco que encontrava-se onde deveria existir sua orelha direita. –Não vou mentir, nem todos estarão vivos ao amanhecer! Deixemos que Mitra capacite os fortes e leve os fracos. Vocês querem morrer essa noite? _Os soldados responderam com júbilo em um satisfatório grito de guerra; Lanças e espadas ávidas em provar o sangue.
O vozerio fora acalmando a medida em que a massa negra e disforme surgia no horizonte, deixando as diminutas florestas ao leste. Eles se aproximavam devagar, de forma quase arrastada. Não havia sinal de tochas, apenas uma grande mortalha que ganhava os vales em lentidão. Vagavam sem qualquer formação de combate e com suas lanças erguidas; algumas com bandeiras fixadas nas pontas. Bandeiras rasgadas cujo símbolo não era o de Attasia – Uma flecha entre dois rios, era o estandarte de Minória (o vilarejo brutalmente tombado há mais de um mês). Os olhos de Baal se arregalaram frente a bandeira sórdida quase no mesmo instante em que um vento frio que conduzia um forte cheiro de carniça os acometeu. Moscas pousavam nos soldados, desconcertando-os; Os pequenos insetos também foram conduzidos pelo vento pútrido. Aquele miasma nauseou parte dos guerreiros que, distraídos, só voltaram seus olhares para o problema quando o grito desesperado de Baal ecoou da linha de frente.
-NÃO SÃO OS ATTASIANOS!
As carrancas determinadas se transformaram em caretas de medo quando o primeiro soldado inimigo adentrou a área de penumbra causada pelas fogueiras; um ser decadente, cuja pele flácida se pendurava em ossos protuberantes. Seus olhos eram brancos e vazios, capazes de reluzir as chamas, e seus intestinos se penduravam, vazando por um severo corte na frente do seu gibão de couro corroído. A carne podre do braço esquerdo já havia sido moída pela decomposição, deixando apenas os ossos, mas o braço direito se mantinha firme, arrastando uma espada de bronze pelo chão de terra batida. O exército de Minória estava de pé novamente e Baal tinha razão; Ninguém passaria por eles com vida.
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